As lições de 2017 e seu legado para 2018

Escrito por Marcelo Sant'Iago

Fotos por Marcelo Sant'Iago

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Passei boa parte de 2017 viajando para participar de eventos e visitar bares em alguns dos principais mercados de coquetelaria do mundo. Ainda falta muita coisa para ver (e beber), mas isso me ajuda a entender melhor os caminhos da coquetelaria mundial. Quero dividir aqui o que aprendi no ano que passou e como isso deve, na minha opinião, influenciar o mercado brasileiro.

Pesquisas mostram que a geração atual é mais saudável e bebe menos do que as anteriores. Porém, preferem destilados à cervejas e vinhos. Como promover o consumo consciente e educar seu paladar? Em 2017 nos diversos bares que visitei, a presença de drinks sem álcool e outros de leve teor é uma constante. Aqui, esse verão de 2018 tem tudo para ser o "ano da água tônica". Spritz, Collins e Fizz são categorias de drinks que poderiam ser mais bem exploradas no Brasil, assim como os refrescantes e versáteis Daiquiris.

Também tem sido muito claro o resgate de coquetéis clássicos em novas versões. O celebrado bar Artisian, em Londres, acaba de lançar uma belíssima carta apenas com releituras criadas por Remy Savage, ex- Little Red Door e que esteve no Brasil em 2017, fazendo um guest no Guilhotina. Aqui no Brasil, talvez o melhor exemplo seja o Frank Bar, onde Spencer Amereno Jr. dedica boa parte de sua carta a esse tipo de drinks.

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Maverick Negroni, do Frank bar. Foto de Leo Feltran

Preço e rapidez também são duas variáveis cada dia mais importantes. Com o aumento da oferta de boa coquetelaria pelo Brasil, ninguém parece estar mais disposto a esperar muito por um simples G&T e nem pagar uma fortuna por isso. Em São Paulo, o Boteco Paramount inaugurou essa tendência de bom e barato, que já começa a se espalhar.

E antes que eu me esqueça: gelo em taça coupe. Tá rolando forte e você - bartender e bebedor - vai se acostumar.

Mas há 3 pontos específicos que observei nessas andanças que gostaria de destacar aqui.

Nacionalização

Há um grande interesse em promover produtos regionais. Os Amaro italianos e o renascimento do licor Rosolio, especificamente o Italicus, estão por todos os lugares. Aperitivos franceses, como Suze e Lillet Blanc, também estão muito em alta. O mexicano Mezcal vive seu melhor momento. É o cenário ideal para nossa cachaça crescer ainda mais lá fora.

Aqui no Brasil, o lado positivo disso é que começamos a criar uma identidade nacional própria, a valorizar ingredientes da terra na criação de drinks. Houve um resgate positivo da cachaça e isso é muito importante, pois infelizmente “cachaceiro” ainda é uma expressão pejorativa, para quem bebe ou bebeu demais. O Rabo de Galo passou a ser servido em versões sofisticadas, com ingredientes nobres.

Há ainda outros drinks a serem redescobertos e valorizados, mas a tendência é cada vez mais a criação de novas receitas. Isso é sinal de amadurecimento, pois mostra confiança em criar algo diferente do que está nos livros. O Guarita, bar de Jean Ponce em São Paulo, é um ótimo exemplo de valorização de ingredientes nacionais sem perder foco no paladar do consumidor. O Tom Oliveira vem criando coisas muito interessantes em Florianópolis que não vejo a hora de experimentar.

Outra coisa que não deve ser esquecida é que, para ganhar maior destaque no cenário mundial, há de se pensar como aquele drink com ingredientes típicos do Brasil pode ser replicado em escala e em outros mercados. Pois somente assim, um coquetel tem potencial para tornar-se um clássico internacional.

“Closed-loop cocktails”

Esse é o nome bacana para falar sobre sustentabilidade, uma preocupação cada vez maior das marcas e bartenders.

Uma fruta não é apenas uma fruta: uma fatia é decoração, o suco é mixer, a casca pode ser infusionada em destilado, o bagaço usado para criar um cordial. Tudo é aproveitado, nada desperdiçado.

Nesse mesmo caminho, canudos estão sendo abolidos em bares do mundo todo ou sendo substituídos por opções mais “verdes”. Até mesmo guardanapos de papel estão desaparecendo dos balcões.

Aqui no Brasil a preocupação ainda é baixa, mas cresce rapidamente. Márcio Silva, já tem o seu bar, o Guilhotina, 70% auto-suficiente. No Rio, tanto Tai Barbin, do Nosso, como Jessica Sanchez, do Vizinho, já investem nesse caminho também. No Sul, Claudia Schumacher, do Mini Bar, vai nessa linha.

Veja um vídeo de um "closed loop cocktail" de Wouter Bosch, bartender do Rosalia's Menagerie, um dos meus bares preferidos em Amsterdam.

Drinks “instagramáveis”

Não tem coisa que me incomoda mais do que decoração espetando meu nariz ou atrapalhando o consumo do meu coquetel. Não é à toa que bares super conceituados, como o American Bar do Savoy, Dandelyan, Attaboy, Death&Co e Dead Rabbit, evitam decoração rebuscada em suas criações.

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The Westwood, do Dandelyan em Londres

Há exceções e elas são bem-vindas, claro. O Nightjar, em Londres, assim como outros bares, construiu seu nome com apresentações extravagantes.

É fato que o drink sair bem na foto – literalmente – é uma preocupação tanto de bares quanto consumidores. O Instagram e outras redes sociais focadas em foto e vídeo tem um peso cada vez maior na divulgação de todo tipo de produto e os coquetéis não são exceção. Uma boa luz no balcão, na mesa ou uma decoração exuberante são recursos importantes para que o trabalho do bartender tenha destaque no Instagram. Nada contra, desde que não atrapalhe minha experiência e consumo.

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Gimlet, do The Artisian, em Londres. Servido em uma barra de gelo, cada copo leva um limão diferente

Além disso, há toda uma categoria de perfis voltadas apenas para curadoria de fotos de drinks no Instagram e outra dos chamados Home Bartenders. São drinks lindos, mas, pelas fotos, alguns são impossíveis de se beber e outros feitos com combinações que não parecem funcionar de verdade. Mas quem se importa, pois infelizmente o que vale é a foto ser bonita e receber trocentas curtidas, não é mesmo?

Saúde e Feliz 2018!

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