Bartenders em Casa - Rebeca Elionai

Escrito por Rebeca Elionai

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Oi gente! Meu nome é Rebeca Oliveira, sou de Recife-PE, tenho 25 anos. Sou designer gráfica e bartender e atualmente faço parte da equipe do Cais Rooftop Lounge Bar, no centro do Recife. Também sou uma das criadoras do projeto @rueiras.mixologia que fala sobre coquetelaria de uma maneira sustentável, ancestral e regional.

TUDO ENCANGADO UM NO OUTRO

Ao longo dessas quatro semanas nós vimos que podemos usar nossos ingredientes e nossas histórias dentro da coquetelaria e que o nosso Nordeste é rico em sabores, aromas e comidas e bebidas ancestrais. Conseguimos entender o valor que a nossa cultura tem e seu peso histórico. Aprendemos sobre uma bebida que se tornou patrimônio cultural do Piauí, uma técnica passada de geração em geração. Um fruto versátil e cheio de aroma e sabor que é símbolo em todo Norte e Nordeste.

A gente percebe que não precisa de muito floreio pra construir um sabor marcante, intenso e regional, assim como fizemos em nosso vermute de ervas da caatinga: trouxemos o clássico de sua estrutura e a identidade da região com ervas e cascas de um de nossos biomas.

Valorizar nossos ingredientes é dar vida às histórias de voinha, às comidas de mainha e tudo que aprendi desde pirraia.

Nesse último encontro, não podia deixar de fazer o que gosto mesmo, não tinha como deixar o coquetel de fora. E aí, vamos encangar tudo e fazer um drink massa? Bora!

Gravei um vídeo pra gente se ver, né, depois de 4 semanas já somos chegados! Esse drink que fiz se chama “Os quarto arriado” e tem como base a cachaça 100% ORGÂNICA. Ou seja, desde o plantio da cana até a finalização do destilado não há uso de agrotóxicos, adubos ou substâncias prejudiciais a saúde. Vê que coisa massa, uma bebida limpa todinha assim pra gente.

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A que estou usando hoje é a Sanhaçu, uma cachaça produzida em Chã Grande, premiada e orgânica (CLARO). Nós conhecemos e acompanhamos todos os processos e conhecemos todo o plantio e a feitura do zero à cachaça saída dos barris. Temos também a nossa cajuína que aprendemos a fazer em casa, mas que pode-se também comprar de pequenos produtores nos comércios locais e mercados de bairro. E por fim o nosso vermute que, modéstia a parte, ficou o pipoco!!!

Tentei juntar um pouco de nossa cultura por amar meu país Nordeste, e nada melhor para me ajudar a falar do que um trecho de Patativa do Assaré:

"O nordeste é poesia
Deus quando fez o mundo
Fez tudo com primazia
Formando o céu e a terra
Cobertos com fantasia
Para o sul deu a riqueza
Para o planalto a beleza
E ao nordeste a poesia
O nordeste é poesia
Tocou a mãe natureza
Com toda filosofia
Fez o sol e a lua
O sol quente a lua fria
Para o sul deu fartura
Para o centro, agricultura
Pro nordeste, a poesia "

Já falei muito, vamos para a feitura desse drink? Chega!
Clique para ver o vídeo do preparo do coquetel Os quarto arriado

VERMUTE DE ERVAS DA CAATINGA

Na composição dos coquetéis em bares e restaurantes, vemos um pré-preparo muito mais elaborado para a feitura deles. Novas técnicas, novos ingredientes, infusões que despertam sensações com seus aromas e sabores intensos. O vermute é uma dessas bebidas utilizadas em drinks clássicos e reinventadas para drinks novos. Mas o que é o vermute?

O vermute nada mais é do que um álcool fortificado à base de vinho. Em sua composição temos de 70 a 80% de vinho branco e a porcentagem restante fica com açúcares, cachaça ou aguardente e infusões de ervas.

DE ONDE VEIO O VERMUTE?
Na Alemanha, durante a Idade Média, as pessoas tinham o costume de adicionar ervas dentro de seus vinhos para utilizá-los como remédios. Mas, depois de várias tentativas, notaram que essa mistura não servia para os fins medicinais. A origem do vermute ainda não é concreta pois, além dos alemães, os povos da Grécia, de Roma e do continente asiático também misturavam seus vinhos com ervas diferentes, inclusive a losna, que é uma das principais ervas do vermute.
Em 1786 o vermute passou a ser bebido como aperitivo e começou a ser comercializado na Itália, que tem como tradição a produção de vinho. Vocês devem conhecer o nome do primeiro vermute tinto: Carpano, lançado em Turim, por Antonio Benedetto Carpano..

Dentre os vermutes, temos: o rosso (tinto e doce), o dry (branco seco) e o bianco (branco e adocicado). Hoje vocês vão conhecer um novo tipo de vermute, o artesanal com ervas da caatinga!

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Nesse vermute eu utilizei 70% de vinho branco chardonnay, que tem uma uva mais amanteigada, com sabor mais suave e infusionei com: aroeira, amburana de cheiro, hortelã, capim limão, cidreira e carnaúba. Adicionei mel e cachaça prata, tendo como resultado aromas intensos, um sabor vívido e uma coloração de ouro velho sensacional.

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Essa é apenas uma das possibilidades que temos para, a partir do clássico, inovar e trazer identidade cultural e um sabor regional para nossos coquetéis. Em nosso próximo encontro faremos um coquetel e incorporamos nosso vermute da caatinga para trazer os sabores do sertão! Ansiosos? Eu também estou. Até lá, visse?

CAJUÍNA: PATRIMÔNIO CULTURAL

Certamente, quando conversamos sobre frutas que representam o Nordeste sempre jogam na roda o caju, mas o que é o caju? É realmente nordestino esse fruto? É um fruto?

Puxando o fio do nosso encontro anterior, vou contar um pouco da história dessa fruta marcante, cheirosa, consumida em todo o Nordeste e desejada por todo Brasil.

CAJU E CASTANHA
Quem leu o meu artigo da quarta-feira passada, já deve saber que vou falar sobre uma bebida extremamente nordestina, feita com um sabor tão nosso, que vem de agricultura familiar e pequenos produtores. Já se ligou, né? Então vamos conhecer a Cajuína. Sim, aquela cajuína que o Caetano Veloso canta, cristalina em Teresina.

Vamos viajar para o Piauí. Não, não... vamos voltar mais um pouco na história, vamos para a Amazônia, que originou o caju, e durante o processo migratório chegou no Nordeste, onde desenvolveu de tal forma que se transformou em uma das frutas mais associadas à região. O nome descendente da palavra indígena "acaiu", que em tupi quer dizer "noz que se produz".

Mas o caju é realmente um fruto?

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O caju é um pseudofruto, o fruto do cajueiro é na verdade a castanha e, junto a ela, tem-se a flor e o que chamamos de fruto, né, a carne de caju. Pode ser consumido natural, em xaropes, chás, suco e, é muito rico em vitamina C e ferro.

A cajuína foi inventada em 1900 por um farmacêutico, cuja ideia era combater o alcoolismo, pois as pessoas estavam consumindo de forma exagerada a cachaça. Então, quis usá-la como substituto não alcoólico. Ela nada mais é que a água do caju e seu processo de produção tem 4 fases:
1. Extração (amassando pra tirar o suco): é quando retiramos todo o suco da fruta. Recomenda-se que faça numa prensa, mas pode ser feito com as mãos, no caso de uma feitura caseira de pequeno porte.
2. Clarificação (tirando o ranço): é quando se faz a separação entre a polpa e a água, ao adicionar gelatina sem sabor.
3. Filtragem (não quero a gelatina, quero só a água): é feita com coadores de pano e coada de quatro a cinco vezes, até que perca a coloração e fique cristalina.
4. Cozimento (só não vale queimar a barriga): depois de filtrada, é engarrafada e colocada em panelas com água até cobrir a garrafa, ou deixar só a tampa de fora. Nada mais é do que um banho maria. Esse cozimento aumenta a durabilidade do produto e, mesmo sem adição de açúcar, consegue-se obter uma coloração amarelada, caramelizando o açúcar do próprio fruto.

Fonte site do IPHAN

Devido à sua propagação e à sua tradição dentre as famílias e devido à sua hospitalidade quando apresentada a outras pessoas, a cajuína se tornou um patrimônio cultural, fazendo com que a bebida tivesse tanta importância quanto uma comida. A sua prática de feitura é passada de geração em geração por pequenos produtores, famílias nos interiores do Piauí, Ceará e outros Estados e cidades do Nordeste.

Tornou-se um ritual a degustação da cajuína com vizinhos, parentes e amigos, comparando e trocando experiências e histórias sobre os seus produtos, criando um laço familiar e mostrando que a herança afetiva através do alimento e da cultura vale mais do que qualquer coisa.

Se vocês quiserem conferir a feitura artesanal da cajuína, corre lá no @rueiras.mixologia no Instagram, que fizemos e vamos te mostrar, pra que você possa sentir o sabor e que isso te plante uma memória afetiva do Nordeste!

NORDESTE DENTRO DA COQUETELARIA : REGIONALIDADE, CULTURA, IDENTIDADE & SABORES

Resumo
Quando falamos em Nordeste, qual a primeira coisa que vem à cabeça de vocês? Calor, mar, cuscuz, cachaça, frutas exóticas, forró, axé, carnaval? Sim, estão certos: somos conhecidos por nosso clima, nossas paisagens litorâneas e nossas festas de rua, mas quero apresentar mais a vocês. Quero mostrar nossa região dentro de nossa área profissional, que é a coquetelaria. E a coquetelaria do Nordeste, já ouviu falar? Integrar a cultura, a identidade, o território e a história para criar uma assinatura em seus coquetéis, criando uma experiência que é degustar um drink. Uma imersão na história, uma viagem nos sabores.

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Palavras-chave: Coquetelaria. Nordeste. Gastronomia. Regionalidade. Cultura.

Abstract
When we talk about Northeast, what is the first thing that comes to your mind? Heat, sea, couscous, cachaça, exotic fruits, forró, axé, carnival? Yes, you are right, we are known for our climate, our coastal landscapes and our street parties, but I want to introduce you to more, I want to show you our region within our professional area, which is the cocktail shop. And the northeastern cocktail, have you heard? Integrate culture, identity, territory and history to create a signature on your cocktails, creating an experience that is tasting a drink. An immersion in history, a journey in flavors.
Keywords: Cocktail shop. Northeast. Gastronomy. Regionality. Culture.


REGIONALIDADE
Para que possamos entender um pouco mais sobre a relação dos sabores do Nordeste é preciso explicar o que é regionalidade. As relações entre a nossa vida cotidiana, como: cultura, sociedade, a gastronomia, dentre outras, acontecem em um local. Esse espaço, além de um referencial geográfico, ganha mais significados devido a sua história e à cultura de quem vive nesse lugar. Essa identidade é graças aos locais que mantêm vivas as crenças e culturas, sempre fortificando as tradições que se enraízam com o passar do tempo.
A alimentação pode ser considerada como um dos elementos principais na construção da identidade dessas regiões, já que se alimentar é um ato vital, sem comer não teríamos possibilidade de viver. Mas a comida vai além, trazendo consigo um peso cultural. Nosso objetivo será reconhecer os aspectos culturais da região nordeste e como introduzi-los na coquetelaria, com ingredientes cotidianos e receitas tradicionais, mas também dando espaço para inovação.

CULTURA
A cultura do Nordeste é repleta de variações: temos nossa festa junina, carnaval de rua, papangus de Bezerros, literatura de cordel, artesanato, frevo, maracatu, coco, repente, baião, capoeira e nossas comidas típicas que são diversificadas e para todos os gostos. A cultura vai mais além, nossa cultura entra pelas histórias do povo, nos interiores e nas cidades grandes, das grandes festas para as comemorações caseiras de nossas datas comemorativas. Mas onde quero chegar com tudo isso? Logo, logo, vão entender.

IDENTIDADE E SABORES
Identidade é quando nos sentimos parte daquele grupo ou daquela história por qual somos influenciados, e é essa sensação que deve ser causada pelo coquetel. Quando o bartender está no processo de elaboração do seu drink ele leva em consideração seus ingredientes, a harmonia entre eles, a sensação que eles causam e a história por trás do drink.
Aí é onde entramos com a influência da cultura em nossa criação, seja a cultura alimentar ou a cultura das artes. Pense comigo: posso utilizar como guarnição algum insumo artesanal feito pela e na região Nordeste, uma fruta típica, um óleo essencial de alguma erva proveniente da caatinga ou posso usar um artesanato para ser meu copo, ser a base histórica da minha apresentação (como uma guarnição não comestível, claro). A experiência com sua história, seu efeito visual, sua essência que traz uma memória afetiva ou remete a algum lugar específico de acordo com seus ingredientes.
Importante dizer que utilizar insumos, produtos, ervas nativas e cerâmicas locais fortalece e ajuda pequenos produtores e artesãos, agregando um valor regional, cultural e econômico ao coquetel. Visse?

NA COQUETELARIA
Depois de conhecer e entender o que é a regionalidade, a cultura e a identidade, vamos entrar no nosso lindo Nordeste e trazer à tona toda nossa história dentro dos coquetéis com seus sabores bem característicos.
Fazemos produções diárias ou semanais para trabalhar em nossos coquetéis, insumos como: xaropes, infusões, guarnições, tinturas, bitters, licores e outros. O que podemos fazer é acrescentar nessas preparações ingredientes de nossa região como, por exemplo: xarope de caju, tintura de coentro, Vermute de ervas consumidas diariamente por milhares de moradores de várias regiões do nordeste (capim santo, erva cidreira, alecrim...).
Esses são só alguns exemplos e, pensando dessa maneira, você já pode notar um diferencial na construção do seu coquetel. Como, por exemplo, a cachaça, que é bastante consumida no norte e nordeste, e a produção de cachaças orgânicas vem crescendo cada vez mais. Trata-se de uma união de sabores, os sabores da cachaça, que variam entre suas madeiras de armazenamento, e os sabores de nossas frutas tropicais, sabores marcantes e cultivados no nosso quintal.
A variedade de frutas, ervas, raízes e cascas que temos aqui levariam muitas páginas para serem lidas, então isso fica como um incentivo para que você, bartender ou apreciador de coquetéis, possa pesquisar e conhecer mais sobre nossa região rica em cultura artística e gastronômica. E para fechar nosso coquetel precisamos trabalhar seu visual.
Pensando em introduzir uma região não só com seus sabores e aromas, vamos também trazer uma marca, um destaque para nosso coquetel, que seria uma guarnição. Sabemos que o impacto visual gera o interesse e abre o apetite, então a apresentação do drink tem tanto valor quanto seu sabor. Uma cerâmica feita por um artesão caseiro acrescenta beleza e história pro drink, uma base traz uma diferença e conta sua história por inteiro, é o que torna a experiência de quem consome em uma viagem, e assim você cria a identidade cultural do seu drink.
Se esse assunto te interessou e encheu teus olhos, então marca na tua agenda nosso próximo encontro, visse? Vamos aprender a fazer uma bebida nordestina, patrimônio cultural do Piauí, ficou curioso? Oxe, então segura a ansiedade que semana que vem cê descobre.

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